terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Ensaio pruma crônica familiar (ou "em busca de um umbigo mais antigo")

Em Keret Lunga todo mundo era feliz - tão feliz, mas tão feliz, que não sobrou ninguém naquele pedacinho de ruas poeirentas com sorte, mas no mais das vezes coberta pela lama, pedregulhos ou uma neve que não tem parentes fora do Leste Europeu, ladeada aqui e ali por casas simples, de pedra e palha.

Com o tempo, quem sabe, ruas mais retas, prédios frios de cimento barato, face dura, uniforme, pontas de ferro retorcidas nas extremidades, repletos de pequenos escritórios ou moradas dos gloriosos camaradas.

Talvez nada disso. Talvez, sempre, uma pequena e próspera cidadezinha mercantil-rural, com suas crianças com carinha de cingenä correndo de orelha furada e roupa remendada, as escolas, os homens sérios embigodados, os pavores da guerra, as esposas roubadas no caminho para Tighina.

De repente, fuga por Viena, Paris, Marselha, o mar inteiro, o Rio de Janeiro, São Paulo, o cortiço, a fábrica, os compadres e o futebol alvinegro - a família inteira indo e perdendo os sotaques, as palavras, os costumes e tudo aquilo.

Foi-se Keret Lunga, tão longe que não tem mais jeito de se olhar pra trás.

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