quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Barro

Caindo de joelhos no barro o velho falava sozinho: "Agora é Deus pra me ajudá!". Com a voz tremendo.
Disse isso e começou a procurar o quão rápido sua idade permitia. Engatinhando.
A alvura de seu cabelo contrastava com a negritude de sua pele. E principalmente com o fundo: mata escura, de noite sem lua.
Barulho? Só de grilo, bicho pequeno que corria e, lá longe, gritos de socorro. Gritos de mulher.
Eram das filhas do velho de joelhos.
Velho que só tinha de fazer uma coisa: buscar a carta do Coronel no casarão vizinho. Só isso.
No caminho, na pressa, derrubou, mas não viu. Quando voltou, abriu a mão e gelou. Voltou pra procurar e se acaso o chamassem: ainda não tinha voltado. Sabia que chegar sem a carta era pior.
O Coronel tinha pressa, e agora, ele também. "Que será das minha minina?!".
Procurar naquele barro molhado, pressa e pressão dos gritos das filhas. Não dá certo.
Não deu!
Quando parou de ouvir o grito duma delas, a mais nova, correu o mais rápido que pôde. Mas a pressa só piorou, chegou a tempo de ver a outra também ser morta. Da porta.
O coronel, do alto das botas, trombou nele ao sair: - Pra nêgo preguiçoso ir mais rápido da próxima vez!

Sujo de barro. Aterrorizado e parado na porta.
Não se aguentava de dor, de horror e de pena.
"Pena que eu deixei cair o diamante".

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